O Patrono

ALMIRANTE
FRANCISCO CORDEIRO TORRES E ALVIM
Barão de Iguatemi

Prof. Guilherme de Andréa Frota

Relatório elaborado em parceria com seu companheiro, Segundo-Tenente José da Costa Azevedo, existente em manuscrito da época, sem assinaturas, na Seção de Manuscritos da Biblioteca Nacional do Rio de Janeiro.

Almirante FRANCISCO CORDEIRO TORRES E ALVIM
Almirante FRANCISCO CORDEIRO TORRES E ALVIM

PRIMEIROS ANOS

Nasceu na cidade do Desterro, a 4 de agosto de 1822, segundo filho da numerosa prole de treze, havidos do Chefe de Esquadra Miguel de Souza Mello e Alvim e D. Maurícia Elysia.

De sua infância nas plagas catarinenses pouco se sabe. Com 16 anos e 7 meses, transferiu-se para o Rio de Janeiro, assentando praça de Aspirante por Aviso de 4 de março de 1839. Cursou a Academia de Marinha alcançando reputação de bom estudante, conquistando muitas “aprovações plenas”, a maior honraria da época. Recebeu promoção a Guarda-Marinha em 11 de dezembro de 1841 e a designação de embarque na fragata PARAGUASSU, onde realizou a viagem de instrução.

Participou, em seguida, embarcado na fragata CONSTITUIÇÃO, da importante comissão que conduziu a Imperatriz Theresa Cristina de Nápoles até o Rio de Janeiro. Muitos ensinamentos auferiu o jovem Alvim de seu Comandante, o Chefe de Divisão Theodoro de Beaurepaire, bem como da pequena corte que envolvia a Imperatriz. A viagem total durou de 3 de março a 3 de setembro de 1843.

Em pouco mais de três meses, a 21 de dezembro, recebia as platinas de Segundo-Tenente. Embarcado na charrua CARIOCA, seguiu para o sul. Desejoso de se aperfeiçoar, pediu e obteve um estágio na Marinha Norte-Americana. Por isso, passou-se para a fragata CONGRESS e, a 13 de janeiro de 1844, seguiu para os Estados Unidos, onde permaneceu todo o ano de 1845 e parte do de 1846. Muitos elogios o acompanharam no regresso. Preparou um extenso Relatório, em parceria com seu companheiro, Segundo-Tenente José da Costa Azevedo, existente em manuscrito da época, sem assinaturas, na Seção de Manuscritos da Biblioteca Nacional do Rio de Janeiro.

NAS GUERRAS DE ORIBE E ROSAS

Entristeceu-o a incumbência de servir no Arsenal de Marinha do Rio de Janeiro: o mar era o seu elemento. Nessa função despendeu pouco menos de um ano, conseguindo reembarcar na fragata CONSTITUIÇÃO, capitânia da Divisão do Sul. A região platina estava, a essa época, a exigir cuidados especiais do Governo Imperial, em virtude das pretensiosas atitudes de Juan Manoel de Rosas, Ditador de Buenos Aires. Agiu a nossa diplomacia obtendo a intervenção anglo-francesa, de resultados pouco satisfatórios, e reconhecendo a Independência do Paraguai, para onde seguiu uma Missão Militar.

O nosso Governo determinou, também, o estacionamento de uma Força Naval no Rio da Prata. Em 2 de maio de 1848, o Tenente Alvim achava-se embarcado na corveta DOIS DE JULHO, uma das nove unidades dessa Força, as quais respondiam ao comando do Chefe de Divisão Ferreira de Oliveira.

Promovido a Primeiro-Tenente (14 de março de 1849), Alvim ganhou, igualmente, no dia 26, o seu primeiro comando, o brigue-escuna EOLO.

Em megalomânico desvario de reconquistar o espaço físico do Vice-Reinado do Prata, Rosas concedera a Manoel Oribe posto e forças para invadir seu próprio país: o Uruguai. 14.000 portenhos cercavam Montevidéu enquanto os estancieiros brasileiros, residentes naquele país, se viam obrigados a emigrar para terras gaúchas.

Dez longos anos suportaram, os habitantes de Montevidéu, o assédio das indisciplinadas hostes de Oribe, sustentados, em parte, graças ao apoio financeiro prestado pelo Barão de Mauá e por nações européias. Fracassadas as negociações diplomáticas, resolveu o Governo Imperial intervir. A 29 de maio de 1851, assinava-se Tratado com o Governo de Montevidéu, representado pelo General Eugênio Garzón, e com o da província argentina de Entre Rios, General D. Justo José Urquiza.

Na esquadra em operações no Rio de Prata, comandada pelo Chefe de Esquadra John Pascoe Grenfell, encontrava-se o brigue CALÍOPE, comandado por Alvim (desde 5 de junho de 1851), que recebeu ordens de se postar no Canal do Norte. O rigoroso cerco naval e mais o deslocamento de tropas brasileiras, totalizando vinte mil homens, sob a liderança do Conde de Caxias, e a intervenção do General Urquiza, provocaram a rendição de Oribe a este último em Passo Molino (11 de outubro).

Estava dominado Oribe. Os Chefes Aliados julgaram acertado prolongar as operações e derrubar o Ditador Rosas. A 21 de novembro, no acampamento do Arroio Pantanoso, assinaram novo Tratado de Aliança, com a adesão da província argentina de Corrientes.

Organizaram, então, os Chefes Militares, um plano tático, quase todo concebido pelo gênio de Caxias, o qual incluía o transporte de forças brasileiras, quatro mil homens chefiados pelo Brigadeiro Manoel Marques de Souza, pelo rio Paraná, por unidades da Esquadra, a fim de desembarcarem em Diamante, onde efetuariam junção com as forças de Urquiza. Para tanto era mister atravessar o fortificado Passo de Tonelero, onde o General Lúcio Mancilla, dois mil argentinos rosistas e 16 peças de artilharia, desejavam impedir o avanço de nossos navios e a consecução do plano militar.

O Chefe Grenfell dispôs que somente sete navios de sua força seriam incumbidos dessa missão de transporte. Dentre estes, o brigue CALÍOPE era o mais fraco em estrutura e armamento para enfrentar as baterias da barranca de Acevedo. Navio de casco de madeira, construído no Arsenal de Marinha do Rio de Janeiro, com risco de José Joaquim Ribeiro Pimenta, deslocava apenas 194 ton., com propulsão a vela, artilhado com uma colubrina de 24 mm e 12 caronadas de 18 mm, possuindo uma guarnição de 72 homens. Compensava a fortaleza de seu comandante, que, com semblante calmo e de resplandecente bravura, ia abrindo, com a proa de seu brigue, o caminho para a História. Ocupando a cauda da linha, o brigue CALÍOPE e todos os que nele se achavam naquele dia 17 de dezembro de 1851, sofreram nutrido fogo inimigo. Mas, em oitenta minutos, completava-se a missão que se destinara à Marinha.

Alvim recebeu a comenda de Cavaleiro da Ordem do Cruzeiro (03.03.1852), a Medalha de Prata nº 2 da Campanha (01.04.1852) e vários elogios que constam de sua Fé de Ofício.

A VIAGEM DA IMPERIAL MARINHEIRO

Em 8 de agosto de 1852, Alvim entregou o comando do CALÍOPE e recebeu o do brigue BERENICE. Por decreto de 2 de dezembro de 1854, alcançou o posto de Capitão-Tenente. Participou de uma expedição diplomático-militar de desagravo contra o governo de Carlos Antônio Lopez do Paraguai, tendo o Chefe de Esquadra Ferreira de Oliveira se apresentado nas Três Bocas e em Assunção (14.03.1855) como plenipotenciário do Império; mas o distinto militar deixou-se envolver pelos diplomatas paraguaios, prejudicando as conclusões de sua missão.

A 15 de setembro de 1855, Alvim foi nomeado comandante da IMPERIAL MARINHEIRO. As suas façanhas nas ondulosas e revoltas águas dos mares sulistas bastariam para enobrecer-lhe a memória. O Governo promoveu-o a Capitão de Fragata em 2 de dezembro de 1856.

Regressou ao Rio de Janeiro, designado para a missão de conduzir à Europa uma turma de Guardas-Marinhas, viagem que durou de janeiro de 1857 a fevereiro de 1858, na qual conquistou louvor pelo Aviso de 11 de fevereiro de 1858. Alvim era um apologista dessas viagens não só porque ilustrava os futuros oficiais, como informava a outros povos e governos a real situação de nossa nacionalidade e cultura. Dela deixou interessante relato o Primeiro-Tenente Sabino Eloy Pessoa em livro intitulado Viagem da Corveta Imperial Marinheiro (Rio de Janeiro, Tip. do Correio Mercantil, 1860, 124 pgs.). A partir de 7 de janeiro de 1859, Alvim passou a ostentar no peito a condecoração do Oficialato da Ordem da Torre e Espada e, logo depois, a 9 de maio, a usar o Hábito de Cavaleiro da Ordem de S. Bento de Aviz.

Em virtude do Aviso de 5 de janeiro de 1860 assumiu o comando interino da Divisão Naval do Rio da Prata.

CASAMENTO E PROLE

Alvim contraiu matrimônio com D. Carmem Genoveva Ferreira, segundo consta, em 1860, com a qual teve filho homônimo, Júnior, nascido em Montevidéu, em 26.06.1855. Este jovem ingressou na Marinha, seguindo as pegadas do pai, como Aspirante, a 7 de março de 1871; promovido a Guarda-Marinha a 27 de novembro de 1873; a Segundo-Tenente em 27 de dezembro de 1875, tendo solicitado baixa em dezembro de 1879, sem que pudéssemos apurar os motivos. Seu segundo filho, Emilio, também nasceu em Montevidéu, em 1859.

SONDAGENS OCEÂNICAS

Nova comissão o aguardava, agora a exigir a argúcia de seus conhecimentos científicos. A ligação da Europa ao Brasil, por intermédio de um cabo telegráfico submarino, determinou a sondagem e mapeamento de profundidades oceânicas. Em julho de 1861, Torres e Alvim passava a comandar a corveta a vapor BEBERIBE com o encargo de sondar o Atlântico, do Cabo de S. Roque até as ilhas de Cabo Verde. Seu substancioso Relatório revela a exatidão e o cuidado com que desempenhou essa tarefa. Durante essas fainas ascendeu ao posto de Capitão de Mar e Guerra (02.12.1861); já ostentava a condecoração de Cavaleiro da Ordem de S. Bento de Aviz (09.05.1860).

OUTRAS COMISSÕES

O Governo Imperial resolveu enviá-lo, uma vez mais, para a Divisão Naval do Rio da Prata, exercendo o comando interino da mesma, pela segunda vez, de agosto de 1862 a fevereiro de 1863. Recebeu, em seguida, o comando da corveta BAHIANA e uma cadeira no Conselho Naval. Passou rapidamente pela chefia da Divisão Naval da Bahia e do Segundo Distrito Naval. Não podia, porém, o seu espírito inquieto, conformar-se: ansiava por colocar-se ao lado dos que se aprestavam para lutar contra o governo de Atanázio Aguirre e a tirania de Francisco Solano Lopez. Pediu e foi atendido.

A 24 de junho de 1865, Alvim passou a integrar a Força Naval no Rio da Prata, em comando do Vice-Almirante Visconde de Tamandaré.

NA GUERRA DA TRÍPLICE ALIANÇA

Cheio de entusiasmo, Torres e Alvim apresentou-se na corveta NICTHEROY no dia 13 de julho. O Vice-Almirante entregou-lhe o Comando da 3ª Divisão, estacionada no rio Paraná. Assumiu-o em 2 de agosto, na corveta BEBERIBE, que recebeu o seu pavilhão. Consigo trouxera 400 praças Voluntários da Pátria, víveres e munições nos vapores MAGÉ, IVAI e ITAJAI.

Comandava, a Força Naval no rio Paraná, o Chefe de Divisão Manoel Barroso da Silva que, pouco antes, cobrira-se de glórias em frente a Riachuelo e lograra, em seguida, 18 de junho, passar pelas defesas e artilharia paraguaias em Mercedes. Encontravam-se no Chimboral, fundeados, um pouco abaixo de Corrientes. é preciso lermos o Diário do futuro Barão do Amazonas para compreendermos os padecimentos daqueles heróis numa região de clima agressivo, com 1/4 de raça e em deplorável estado sanitário.

PASSAGEM DE CUEVAS

Não tinham esmorecido os inimigos: Lopez ordenara ao Coronel Bruguez que se deslocasse com suas baterias para o passo de Cuevas, altaneira barranca sobre um canal estreito e tortuoso. Bruguez dispunha de 30 canhões, foguetes à congreve e 3.000 atiradores. Sua missão era destruir a esquadra vencedora de Riachuelo ou, pelo menos, bloqueá-la.

No dia 9 de agosto, o vapor ESMERALDA contatava com a Divisão do Chefe Barroso, portando a ordem do Vice-Almirante de movimentação. No dia seguinte, Barroso já se encontrava em Bela Vista e se preparava para ultrapassar Cuevas. às 10 horas menos um quarto (segundo a parte oficial do Chefe Barroso), teve início o forçamento da barranca artilhada. Durante meia hora desse 12 de agosto, o fogo vivo e destruidor das baterias paraguaias quase atingia o seu intento. A BEBERIBE, terceiro navio da linha, teve rompido um gualdrope do leme, desgovernando-se na correnteza do rio; não se perturbou Torres e Alvim que, ajudado pelo Primeiro-Tenente Fortunato Foster Vidal e marinheiros, empregou a força de seus músculos para dirigir o seu navio enquanto a guarnição respondia a altura às provocações inimigas. Assim, evitou-se um abalroamento com os outros navios e, por certo, um grande desastre. A BEBERIBE somou o maior número de mortos e feridos. Mas a Divisão Naval do Chefe Barroso fundeava em Rincon de Soto, pouco acima de Goya, mantendo os efeitos da Batalha de Riachuelo.

Enquanto esses efeitos navais prendiam a atenção, o Exército Aliado concentrava-se a leste de Corrientes e ao sul de Três Bocas, preparando-se para invadir o Paraguai. Lopez passara à defensiva, encastelado em suas fortalezas inexpugnáveis, contando, como aliado, com o quase nenhum conhecimento geográfico de seu país.

A GUERRA DAS CHATAS

Reorganizada a Esquadra em 21 de fevereiro de 1866, num total de 22 navios, coube a Torres e Alvim o Comando da 3ª Divisão (BEBERIBE, MEARIM, YPIRANGA, PARNAÍBA, encouraçado TAMANDARÉ e aviso LINDÓIA). A 17 de março, entre 8 e 9 da manhã, desferraram todos de Corrientes em direção a Três Bocas. No APA tremulava o pavilhão do Vice-Almirante Tamandaré.

A colocação de tropas em solo paraguaio demandava uma operação anfíbia que necessitava se revestir do máximo êxito, condicionada a um estudo da região fluvial das Três Bocas e adjacências. Por isso, o Vice-Almirante nomeou uma comissão hidrográfica (Primeiros-Tenentes Silveira da Mota, Von Hoonholtz e Cunha Couto) e incumbiu Torres e Alvim e sua Divisão de prestar-lhe o indispensável apoio militar. Tarefa de imenso risco, levando-se em conta o desconhecimento total daquelas paragens mal ou nunca hidrografadas.

Embuçados nos matos ignotos, valendo-se da artilharia do forte de Itapiru, os paraguaios procuravam dificultar a consecução desse empreendimento ou, pelo menos, retardá-lo, abatendo o moral dos que pretendiam invadir seu território. Aplicaram com sucesso o terrível engenho de sua descoberta, a famosa chata, pequena embarcação sem locomoção própria, armada de um canhão de 68. Essa fase permanece conhecida como a Guerra das Chatas. Nesse ambiente iniciaram-se as hostilidades da nossa Esquadra contra os paraguaios.

Enquanto Alvim e seus comandados procediam ao levantamento e sondagem dos canais e passos, conjunto de informações necessárias aos Chefes, multiplicavam-se os duelos de artilharia. O combate do dia 25, contra uma chata e perto de 800 artilheiros paraguaios sustentado pelo TAMANDARÉ (Comandante Mariz e Barros) e pela HENRIQUE MARTINS (Comandante Jerônimo Gonçalves), demonstrou a bravura de nossos marujos que, por pouco, tomaram a chata; Alvim preferiu inutilizá-la pela artilharia. No dia 27, pelas 4 horas da tarde, uma certeira bala penetrou na casamata do TAMANDARÉ, matando 5 oficiais e 14 praças e ferindo 4 oficiais e 10 praças, incluindo o Comandante Mariz e Barros, que morreu depois de amputada a perna esquerda. No dia seguinte, Alvim também foi atingido por estilhaços de um obus de 68, lançado contra o BAHIA, onde se encontrava; mas esse ferimento não se mostrou suficiente para afastá-lo. Dois dias depois, ainda recebeu a missão de desencalhar o encouraçado BRASIL, consumindo doze horas nessa faina.

Os trabalhos de identificação geográfica prosseguiam. Alvim descobriu um canal pelo norte da ilha de Santana até o Passo de Lenguas (de 5 a 6 de abril), conduzindo o General Hornos (argentino) e o apoiou as forças (900 homens) que o Tenente-Coronel Villagran Cabrita levara para a ilha de Redención, bem fronteira ao forte de Itapiru, numa autêntica manobra diversionária, intentando iludir os paraguaios que o desembarque se efetuaria naquelas paragens do rio Paraná.

Identificado, enfim, o melhor ponto para se efetuar a invasão do Paraguai, talvez resultado das ponderações do Primeiro-Tenente Francisco José de Freitas (carta publicada no Tomo IV do Archivo del General Mitre), o Vice-Almirante Tamandaré reuniu os Comandantes em sua câmara, a bordo do APA (15.04.1866), e transmitiu-lhes as ordens.

Toda a operação de embarque e desembarque das tropas, que totalizavam 54.000 homens, à frente das quais refulgia o valoroso Manuel Osório, e mais os “trens de guerra”, ficou a cargo do CMG Torres e Alvim que, com insignificantes perdas de material, executou a sua missão com rara maestria. Essa ação conjunta, Marinha e Exército, ainda não mereceu o destaque necessário em nossa história naval, tamanhos os ensinamentos da arte da guerra dela auferidos.

BAGAGEIRO

A confiança que Alvim inspirava no venerando Vice-Almirante, colocou-o de novo em ação, mal terminara o transporte de tropas. Comandando as canhoneiras MEAR l M e HENRIQUE MARTINS e o aviso LINDÓIA, navegou rumo à montante do rio Paraná até acima de Toledo, em missão de reconhecimento. Munido de melhores informações, Tamandaré determinou nova posição de bloqueio, agora perto de Curuzu, na volta do Palmar. A partir de 5 de julho, Alvim novamente subiu o rio Paraná e, durante seis dias, mapeou o que pôde, sem o auxílio de nenhum prático.

Os Generais decidiram, em conselho de 18 de agosto de 1866, que o 2º Corpo do Exército, em comando do Barão de Porto Alegre, devia ser chamado ao teatro da luta, numa operação conjunta com a Esquadra. Alvim ficou incumbido da missão de conduzi-los. Comandando a 4ª Divisão, composta das canhoneiras IVAI, ARAGUARI, MARACANÃ e HENRIQUE MARTINS, supervisionou os transportes MARCÍLIO DIAS, PRESIDENTE, GALGO, CHARRUA, GENERAL FLORES, ISABEL, PEDRO II, LEOPOLDINA, RIACHUELO, 16 DE ABRIL, além do ONZE DE JUNHO que servia de hospital e 3 chatas, conduziu, em duas viagens, o efetivo do Barão de Porto Alegre, do Passo da Pátria, a partir de 31 de agosto, para a Guarda do Palmar, completando-se, a 2 de setembro, o desembarque. Esse efetivo totalizava 8.385 homens: 4.141 infantes, 3.534 cavalarianos e 710 da artilharia. O Barão elogiou as diligências do Comandante Alvim e seu procedimento ativo.

E o nosso biografado, sempre bem-humorado, alcunhava o seu importante serviço de bagageiro. Elogios, porém, não lhe faltavam. Não participava, contudo, como era o seu desejo, diretamente da luta. Desempenhou, ainda, uma pequena comissão de policiamento, cortando as comunicações que os de Corrientes faziam com os paraguaios; utilizando pequena força (MEARIM, IVAI e HENRIQUE MARTINS) obteve êxito total.

Apesar da vitória diante de Curuzu, o fracasso do assalto a Curupaiti provocou abatimento geral nos Aliados. Muitos sugeriram ao Governo Imperial negociar uma paz. Mas o Imperador Pedro II, esposando os sentimentos militares nacionais, firmava o ponto de vista da continuidade da guerra, convencendo-se da necessidade de um comando único para as forças de terra e mar.

O FORÇAMENTO DE CURUPAITI

A 20 de novembro (1866), o Marquês de Caxias assumia, em Tuiuti, o Comando em Chefe das Forças Militares Brasileiras; pouco depois, a 22 de dezembro, o Chefe de Esquadra Joaquim José Ignácio recebia o da Esquadra, passado pelo Vice-Almirante Tamandaré a bordo do vapor ISABEL.

Nova missão de policiamento, no mês de dezembro, permitiu que Alvim e seus subordinados inutilizassem várias chalanas no arroio Caraiá e incendiassem um acampamento paraguaio em frente a Itati.

Reorganizada a Esquadra em três divisões, coube a Alvim o Comando da 3ª (encouraçados BAHIA, MARIZ E BARROS, COLOMBO e TAMANDARÉ; corvetas PARNAÍBA, MEARIM e ARAGUAIA), arvorando seu pavilhão no MARIZ E BARROS, em 13 de janeiro de 1867, passando-se, a 25, para o SILVADO. A 21, o Governo Imperial promoveu-o a Chefe-de-Divisão.

Imediatamente, a Esquadra entrou em operação, bombardeando (2 de fevereiro) o baluarte de Curupaiti, ocasião em que morreu o comandante de seu navio, CT Manoel Antônio Vital de Oliveira, quando um elo do estai da chaminé lhe atravessou o pulmão (a Marinha, comemora, nesse ano de 1979, seu sesquicentenário de nascimento). Novo ataque de sua Divisão a 8 de março, das 6 e 30 às 8 e um quarto da manhã, com 532 disparos.

A Semana Ilustrada, prestigioso periódico da Corte, informava, com detalhes, aos seus leitores, os eventos militares; começou a estampar uma correspondência, assinada por Leva Arriba, de tudo que acontecia com a Esquadra. Acreditamos que esse pseudônimo escondia a identidade do próprio Chefe Joaquim Ignácio. Na carta de 3 de março de 1867, publicada na edição de 24 do mesmo mês e ano, Leva Arriba diz: “O Chefe Alvim também pertence ao número dos simpáticos pela lealdade de seu caráter, nobreza de ações e reconhecida bravura.” Eis aí um depoimento autêntico.

No comando de sua Divisão, Alvim liderou outro bombardeio a 29 de maio, quando o Vice-Almirante Ignácio simulou o forçamento do passo de Curupaiti, formidavelmente artilhado por 29 canhões de diversos calibres, destacando-se El Cristiano, e com uma guarnição de 300 homens, sob a orientação do Coronel Paulino Allen. Depois desse reconhecimento, entendeu o Vice-Almirante dar nova organização às forças sob o seu comando, ficando o Chefe Alvim com a 1ª Divisão (LIMA BARROS, HERVAL, SILVADO, CABRAL e BARROSO). Em Ordem-do-Dia de 21 de julho de 1867, o Vice-Almirante enfatizava: – “No momento em que for dada a ordem de avançar, conto convosco: teremos uma hora de sofrimentos, mas deixaremos Curupaiti pela popa, e deixar Curupaiti pela popa, significa aniquilar o prestígio do inimigo e destruir a primeira tranqueira que separa Assunção do resto do mundo civilizado.”

A 15 de agosto, os encouraçados brasileiros, bem conduzidos por homens de valor e coragem, escreviam, por quase duas horas, uma notável página de nossa história. O Chefe Alvim, com seu pavilhão no LIMA BARROS, participava de tudo ativamente, alvo de maior número de balas inimigas (47 no total), pois cobria a retaguarda. Seu navio teve 25 homens fora de combate, 3 mortos, perdendo o braço esquerdo o CT Elisiario José Barbosa, comandante do TAMANDARÉ, amputado pelos cirurgiões da armada João Damazio, José Caetano da Costa, Manuel Saraiva, José Pereira Guimarães, Justino Rabello e Manoel Joaquim da Rocha Frota, este genro do Vice-Almirante.

Transposta esta formidável fortificação, nossos encouraçados jogaram ferros diante de Humaitá, a intransponível. Sua imensa estrutura artilhada inspirava respeito mesmo aos mais audazes. Por isso, o Comandante-em-Chefe, feito Barão de Inhaúma, manobrou os navios e os colocou em posição defensiva e bloqueadora.

HUMAITÁ

Para que se processasse um fluxo normal de abastecimento para os encouraçados da Divisão Avançada, o Chefe Alvim lembrou a construção de uma estrada de ferro pelo Chaco, pela qual transitariam munições de boca e de guerra e se escoariam feridos. Seu nome está definitivamente a ela ligado pois a ideou. Esta estrada, ligando Porto Elisiario a Quiá, construída por fuzileiros navais e prisioneiros paraguaios, recebeu o nome de Afonso Celso (então Ministro da Marinha) e permitiu a permanência da Esquadra em ponto estratégico à vista de Humaitá, fustigando a formidável fortaleza, alquebrando o ânimo dos adversários, produzindo avarias consideráveis. Nessa ocasião (28.12.1867), Alvim foi promovido a Oficial da Ordem do Cruzeiro.

O Almirante Inhaúma aguardava a chegada de três novos monitores para ordenar o forçamento de Humaitá; o bombardeio incessante provocara a ruptura dos cabrestantes que sustentavam as correntes, óbice ponderável; o rio apresentava-se em cheia. O Chefe Alvim fora chamado pelo Almirante para seu Chefe de Estado Maior (03.02.1868), exercendo cumulativamente o Comando da 2ª Divisão, deixando, portanto, o da 1ª que vinha desempenhando. Por esse motivo, Alvim não participou diretamente da Passagem de Humaitá verificada, com êxito, a 19 de fevereiro, liderada por Delfim Carlos de Carvalho, agraciado Barão da Passagem. Curvavam-se todos à perícia e destreza dos brasileiros.

Com a caída de Curupaiti em mãos do Exército Aliado, ficava sem efeito a divisão da Esquadra, que voltou a se unir, reorganizada em quatro divisões. Alvim foi mantido como Chefe do Estado Maior. Continuavam os bombardeios sobre Humaitá. Cercados e faltos de víveres, os paraguaios abandonaram a posição. Nesse momento, Alvim tudo previa e provia; com seu pavilhão no LIMA BARROS, multiplicava sua atividade, transformando em fuga a retirada dos ocupantes de Humaitá; alguns poucos reuniram-se às forças lopistas. Sitiados por terra e água, na lagoa Verá, os paraguaios se defenderam heroicamente e deram muito trabalho. Combates diários em canoas e tremendos corpo-a-corpo na região alagadiça do Chaco, entre 26 de julho e 5 de agosto, permitiram a rendição de grande parte da guarnição de Humaitá.

ANGUSTURA

Terminada essa faina, Alvim dirigiu-se a Pilar, fundeou e aguardou o Almirante Inhaúma. Este ordenou-lhe que forçasse o Passo de Angustura e se juntasse com a divisão do Barão da Passagem. Alvim suspendeu a 26 de novembro, com o HERVAL, CABRAL, COLOMBO, MARIZ E BARROS, canhoneiras BELMONTE, HENRIQUE DIAS e FILIPE CAMARÃO e bombardeiras PEDRO AFONSO e FORTE DE COIMBRA e, depois de muito atirar contra a referida fortificação, cumpriu a missão ordenada. O Governo galardoou-o com a promoção a Dignatário da Ordem do Cruzeiro (28.12.1868) e o Império Russo o dignificou com a Grã-Cruz da Ordem de S. Estanislau.

Assim, a 6 de fevereiro de 1869, Alvim deixava o cargo de Chefe do Estado Maior, chegando ao Rio de Janeiro a 23 do mesmo mês. Seu estado de saúde exigia repouso e recuperação.

NOVAS COMISSÕES

Decreto de 2 de dezembro o promoveu a Chefe de Esquadra, bem como o nomeou membro efetivo do Conselho Naval. Já em grande parte refeito, recebeu a comissão de comandar o 1º Distrito Naval, em 17 de novembro de 1870; arvorou a sua insígnia no encouraçado BRASIL. Nele o Chefe Alvim içou pela última vez o seu pavilhão, época em que recebeu a medalha de Oficial da Imperial Ordem da Rosa (08.06.1871). A 26 de setembro, recebeu a nomeação para ocupar o cargo de Encarregado do Quartel General (hoje seria Chefe do Estado Maior da Armada); assumiu o posto a 27 de outubro.

Muitas vezes condecorado, Moço Fidalgo da Casa Imperial, obteve, a 10 de julho de 1872, o título de BARÃO DE IGUATEMI (rio afluente do Paraná, localizado em Mato Grosso do Sul).

Dedicou-se a diversas atividades administrativas na comissão de Encarregado do Quartel General, sempre empregando seu talento, experiência e dedicação. Decreto nº 5278, de 10 de maio de 1873, colocava em execução novo Regulamento do Quartel General, de sua autoria.

DE NOVO NO PARAGUAI

Pouco depois, em 28 de agosto, Iguatemi deixava esses encargos, muito louvado pelos serviços prestados. O Governo resolvera destiná-lo para uma árdua missão: a de desmontar todo o material da Marinha existente no Paraguai. Assim, nomeado Chefe das Forças Navais do Brasil no Paraguai e Mato Grosso, embarcou-se no vapor VASSIMON e, a 20 de setembro, assumia seu cargo em Assunção, servindo-lhe de capitânia o encouraçado BARROSO. Desenvolvendo grande atividade, o Barão pôde preparar todo o material que devia ser transportado para Ladário ou para o Rio de Janeiro. Concluída a tarefa, pediu exoneração e passou o comando ao Barão da Passagem, em 5 de julho de 1874.

NA DIREÇÃO DA ESCOLA DE MARINHA

Retornando ao Rio de Janeiro, Iguatemi voltou a integrar o Conselho Naval (06.08.1874), do qual se afastara, assumindo, a 23 de novembro, o cargo de Diretor da Escola de Marinha, em cuja comissão ascendeu ao posto de Vice-Almirante Graduado (Decreto de 28 de dezembro). Nesta Escola, formadora dos futuros oficiais, deixou, o Barão, impresso o seu caráter, com o exemplo de sua personalidade e passado glorioso nos jovens Aspirantes. Seu espírito reto e firme e as múltiplas e variadas atividades que anteriormente exercera, o auxiliaram na tarefa de reorganizar o antigo estabelecimento de ensino, cujo regulamento apresentava-se, por vezes, confuso. E devemos lembrar que a ele devemos a instituição de prêmios anuais, inicialmente pagos de seu próprio bolso. É também importante acrescentar que colaborou na criação do Colégio Naval, nascido no ano de 1876.

Alcançou a efetivação no posto de Vice-Almirante a 3 de dezembro de 1880. No ano seguinte, 29 de janeiro, era galardoado com o grau de Comendador da Ordem de S. Bento de Aviz.

Deixando a direção da Escola de Marinha em 4 de fevereiro, dirigiu-se ao sul, em missão de inspeção aos estabelecimentos e forças navais. Regressou a 22 de junho. Seus relatórios propunham diversas medidas que revelavam o zelo do honrado militar. Muitos louvores o conduziram ao posto mais elevado de Almirante Graduado (Decreto de 22 de abril de 1882), Mas o antigo e rijo herói envelhecera, encanecendo os cabelos no árduo serviço da Pátria; o porte ereto e atlético cedera a um corpo magro e reumático. Fortes dores no braço direito não mais lhe permitiam vestir a sobrecasaca do uniforme. Caracterizado um aneurisma, pensou-se em uma intervenção cirúrgica; ainda assistiu a morte da mãe (26.01.1883) e, dias depois, 10 de fevereiro, prostrado em seu leito, disse: – Deixem-me dormir.

Dormiu para sempre o ilustre Barão.

CONCLUSÃO

Torres e Alvim, lídimo patriota, notável marinheiro, nunca recebeu o bafejo da sorte, não mendigou postos ou comissões, nem correu atrás de honrarias: arrebatou-as com sua bravura, sofrendo, ao longo da carreira, diversas injustiças, sem diminuir o seu fervor marinheiro. Perseguiu, em toda a sua vida, um ideal, o de bem servir à Pátria e à Marinha, independente dos que gravitavam em seu redor. Se o podemos elogiar como militar, se o devemos dignificar como herói dos mais duetos da construção da nacionalidade, não é justo esquecermos o cientista que obteve, pela modificação dos prumos, resultados mais precisos, visando o cumprimento de uma missão hidrográfica, nem devemos olvidar o seu conhecimento eclético, precursor do estofo que hoje constitui apanágio de um bom militar.

Não desejamos concluir esse pequeno estudo biográfico sem omitir o que nos parece ser a definição de sua personalidade. Seus afanosos dias guerreiros permitiram-lhe compreender o valor do soldado brasileiro; lembrou-se, então, de construir um monumento ao MARINHEIRO DESCONHECIDO, tombado em guerra. Projetou uma subscrição pública, arrecadou a necessária quantia e o mandou erigir na Fortaleza de Villegagnon, sede do Quartel de Marinheiros, inaugurando-o a 13 de dezembro de 1876. Coincidência apenas? Ou este invulgar homem anteviu que o dia do nascimento do Marquês de Tamandaré, que na ocasião ainda vivia, serviria, mais tarde, para glorificar o Dia do Marinheiro? Fica a pergunta no ar, pois não conseguimos adentrar em seu pensamento, tal a falta de documentos. O Monumento desapareceu vítima de posterior administração. Permaneceu, porém, a glória de seu idealizador.

Extraído da Revista A Fragata edição de 1979